quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Deixo essa carta na mesa de um boteco onde você esteja.

Eu te amo um pouco abaixo do sol, não me exijas muito.
Calado, sinto arfando por meus poros tua fúria incessante.
Tua pele vermelha, teus olhos quase verdes e teu cabelo preto
junto à barba velha de não se cuidar.
Eu não sei onde, em mim, te amo, mas te amo o máximo que posso.
Eu espero em ti uma salvação que nem em Deus deveria esperar, Nele -
que tudo se espera -.
Te amo muito menos que a Deus, amo mais minha mãe que te amo,
amo igualmente a ti e a mim.
Eu não sei por onde te dizer, mas eu me prometi nunca ser um monstro.
Eu te vejo como um monstro.
Eu te vejo como um monstro.
Eu poderia cravar isso mil vezes em mim.
Em um ano e meio de anonimato você me esconde se está vivo ou morreu.
Eu te amo antes da Terra, eu teria que te amar, não escapei, não quero escapar,
mas se eu escapasse não morreria tanto ao longo do dia.
Eu sou cinza, cinza, cinza.
Eu digo eu mil vezes para você me olhar.
Eu sinto o cheiro ardido da tua pinga, teu copo de bar,
teu vinho seco que poucas vezes vi e tuas roupas sempre sujas e repetidas.
Eu pensei em você em alguns dias de chuva.
Por que você escolheu dormir na rua quando tinha um lar?
Pai, a noite é perigosa, volte, por favor.
Eu não sou bom filho, eu nasci no caminho errado,
eu cortaria meu pulso agora para morrer se resolvesse.
Pai, a gengiva que você machucou na minha mãe ainda dói na minha.
O soco é uma mão que me persegue.
Pai, não suma desse jeito,
mas não apareça porque temos um medo doido de você.
Eu estou cada vez mais próximo ao que não sou para suportar tua falta.
Eu pago meu preço, pai. Encontre o do sinhô.
Vamos ser um pouquinho melhores, por amor,
esse amor de longe que eu nem sei se você me tem...

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