sábado, 21 de junho de 2014

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a minha poesia está à beira do sono, à beira do definhamento, nadando num crepúsculo aborrecido.
quando as outras estrelas chegarem, o ar embeberá do pólen o luto.

meu coração é uma sozinha estrela em osso e sangue que apagou e ficou cariada.

o tempo soletra os augúrios do medo. deito-me sonso, quieto, incompetente;
cubro-me do colo de deus e travo o abafado lamurio antes da garganta.

o meu coração caiu num abismo; quer encontrar o chão de uma vez por todas. despedaçar.

canto, da sepultura invisível que me ampara, meu segredo
– comunhão com o medo e a morte.

proibição infinda da carne e do espírito.

dos olhos nada me sai.
o pedido renegado do (meu) olhar: imersão.

domingo, 11 de maio de 2014

Esfinge: Mil Ochocientos Milímetros de Lo que es Bueno.

Quero dar colo a alguma coisa
que é silenciosa e solitária em ti.

As fábulas migram – graças
esfaqueando o nascente – e
o calor bate à porta;
deito-me sobre teus pés.

O cheiro de teus pelos
está
em minhas orelhas,
no meu repouso: o
desconhecido;
aquilo que é distante e rigoroso,
nos teus lábios.

Não sou nada
&
ardo-te em todas as partículas
                          do uni-verso.

Ao que não me revelas
debruço-me.

Nada do que sei é o que quero.




segunda-feira, 14 de abril de 2014

expulsão: súplica.

Estou deitado, encolhido,
no fundo dos teus olhos.
Ainda assim creio: não me vês.

Um instante de silêncio neste mar profundo
poderia levar tudo embora
sem pedir perdão.

Flutuo - desvinculo:
solidão é a enxada que bato contra o chão
mil vezes por dia debaixo do sol.

Um simples tocar na rosa
e o mundo seria outro,
os espinhos não me ferem;
as pétalas não me atraem.

Quero capim e ranço.
Choro
escondendo o rosto
nos pelos de um cavalo gigante
e doente,
que nunca foi lavado.

Choro em teu peito
todas as noites
desde antes de te conhecer.

Por isso irás embora.

Minha mão segurando a tua
impedirá
a circulação de teu sangue;
sugo-te, alimento-me de ti.

A tirania ressurge.

Desconcentra-me.

Muitas vezes por amor,

coisa torta

que nenhuma ciência alcança

e toda alma pede.

Sem nenhuma capacidade de violência,
entrego as armas.
Assisto o universo brincar
enquanto a âncora me chama...

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Deixo essa carta na mesa de um boteco onde você esteja.

Eu te amo um pouco abaixo do sol, não me exijas muito.
Calado, sinto arfando por meus poros tua fúria incessante.
Tua pele vermelha, teus olhos quase verdes e teu cabelo preto
junto à barba velha de não se cuidar.
Eu não sei onde, em mim, te amo, mas te amo o máximo que posso.
Eu espero em ti uma salvação que nem em Deus deveria esperar, Nele -
que tudo se espera -.
Te amo muito menos que a Deus, amo mais minha mãe que te amo,
amo igualmente a ti e a mim.
Eu não sei por onde te dizer, mas eu me prometi nunca ser um monstro.
Eu te vejo como um monstro.
Eu te vejo como um monstro.
Eu poderia cravar isso mil vezes em mim.
Em um ano e meio de anonimato você me esconde se está vivo ou morreu.
Eu te amo antes da Terra, eu teria que te amar, não escapei, não quero escapar,
mas se eu escapasse não morreria tanto ao longo do dia.
Eu sou cinza, cinza, cinza.
Eu digo eu mil vezes para você me olhar.
Eu sinto o cheiro ardido da tua pinga, teu copo de bar,
teu vinho seco que poucas vezes vi e tuas roupas sempre sujas e repetidas.
Eu pensei em você em alguns dias de chuva.
Por que você escolheu dormir na rua quando tinha um lar?
Pai, a noite é perigosa, volte, por favor.
Eu não sou bom filho, eu nasci no caminho errado,
eu cortaria meu pulso agora para morrer se resolvesse.
Pai, a gengiva que você machucou na minha mãe ainda dói na minha.
O soco é uma mão que me persegue.
Pai, não suma desse jeito,
mas não apareça porque temos um medo doido de você.
Eu estou cada vez mais próximo ao que não sou para suportar tua falta.
Eu pago meu preço, pai. Encontre o do sinhô.
Vamos ser um pouquinho melhores, por amor,
esse amor de longe que eu nem sei se você me tem...

segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Fernanda, dou-te meu coração num cesto de laranjas.

Como atrever-me à travessia,
apaixonar-me de alguém como sou de ti?

Meu grande amor, ter asas expulsa-me
de estar pousado em teus cabelos
como meus poros sussurram-me que devo.

Pequenos braços, como possuo, são impotentes...
Aliviar tua tensão! Que vai do alto da testa
(navio atravessando alvoradas pelo denso cru)
ao início de tua nuca, desenhando o cetro
de tua coluna - vertebral triunfo -.

Uma braçada em tuas águas é um suspiro de fome serena pelo mundo.

Ardo de calor, é suor de homem que trabalha o dia todo.
(Sem malandragem, por ti, nem a mania do boto).

Tuas pedras; meu maná -  boca em sangue,
dentes esfarelados clareando o chão:
É minha estrada de pontos luminosos, só tua.

Tenho sol nos olhos, cansaço; bendita, a quem escolho com eternidade.
Quando os sapatos não me cabem, nas longas estradas, para chegar ao teu colo é
que suporto as feridas nos pés.

Nunca soube um bom modo para dar-te as coisas do mundo.
Sei te amar apenas no impossível.

(À Fernanda Pio)

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

...

Vaguear
Peito em mudez de absorção
inspiro; suspiro
Oco túnel não me quer
Sou verruga.